Resumos dos trabalhos apresentados no XLI Encontro Anual do CEF- Recife – em 29 de novembro a 01 de dezembro de 2012, cujo tema foi -“Os Destinos da Identificação”.
Psicanalista convidada: Angela Jesuíno-Ferretto, presidente da Association Lacanienne Internationale.
Reflexão sobre a sobrevivência do horror ao incesto
Em Totem e Tabu (19213-1914), Sigmund Freud exibe de forma talentosa, ainda que mítica, a transição da natureza para a cultura apoiando-se e usando como cenário-base o contexto da hora primitiva previamente enunciado por Charles Darwin, segundo o qual o atual estado estrutural da sociedade seria resultado da evolução de uma condição anterior/primitiva (horda) centrada no monopólio de um pai sobre todas as fêmeas da horda. Na visão freudiana, a transição natureza-cultura seria, por sua vez, possível graças a interditos como a proibição do incesto e a consequente prática da exogamia. Porém, sobra-nos a pergunta de qual(is) mecanismo(s) torna(am) possível a sobrevivência do horror ao incesto. Hipóteses como a transmissão dos caracteres adquiridos, ideias inatas, identificação e transmissão horizontal apresentam-se ainda impossíveis ou insuficientes para dar conta do porque da aparente imortalidade do horror à prática incestuosa. Assim, parece-me plausível que um maior esclarecimento para a sobrevivência do horror ao incesto exija, mais do que um aprofundamento das hipóteses anteriormente levantadas, o reconhecimento de outros fatores/elementos supostamente negligenciados, e que esses elementos reconhecidos possam, por ventura, ser também encontrados em outros processos psíquicos.
José Valter Jr.
Da identificação do corpo imaginário ao corpo função
Gleci Machado de Lima
Em relação à dimensão da linguagem e interrogações sobre o corpo, pelo viés da psicanálise e da psicomotricidade, verifica-se que a imagem especular só toma forma na dimensão que perpassa a estrutura imaginária do corpo. Estrutura essa antecipada pelo olhar materno, em que, por meio do desejo Outro, o corpo toma forma como lugar de significante. Em um eu, em uma relação de espelho, nesse outro imaginário determinado pelo simbólico, que pressupõe um corpo desejo, corpo erógeno parlante, numa relação imaginária entre “eu” (falo) e os objetos.
Não se trata de distinguir corpo e linguagem, mas de introduzir corpo linguagem psicomotor falante; que no brincar, espaço imaginário, ou na análise lugar da fala poderá desvelar ou constituir um eu Outro.
É pelo investimento da libido da mãe que o bebê deixa de ser carne para tornar-se corpo, são os cuidados maternos desejo do Outro que possibilitam um ser sujeito de linguagem. É pela interdição do pai simbólico que a criança se inscreve na dialética da linguagem do ter ou não ter o falo. Assim, é no momento lógico da constituição do sujeito que poderá ocorrer a identificação com o traço unário, constituído no ideal do eu; contudo, por meio da interdição, com a perda do objeto que instaura a cadeia do significante na metáfora Nome-do-Pai, lugar de desejo posto pela mãe.
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES DO SEMINÁRIO XI
Gleci Machado de Lima
Nas primeiras páginas deste seminário me chama atenção, em que Lacan, articula presença de um desejo de analista e o que sustenta a psicanálise didática na qual Lacan nos propõe a questão, sobre qual é o desejo do analista? Lacan fala de desejo então nos perguntamos à tarefa do analista hoje é de suposto saber ou de real do saber? Tendo em vista que a transferência para Lacan (1964) diz: a respeito ao objeto que nos captura, a esse algo do outro que nos apreende e nos fascina, nos deixando enamorados, algo do significante. Introduzindo o estudo da transferência a partir do tema do amor, Lacan nos mostra que, para ele, a transferência é um amor, um amor genuíno, como nos diz Freud. No entanto, esse amor é como uma repetição de um protótipo infantil, uma crença de que encontramos, na pessoa amada, o objeto que perdemos desde sempre, objeto que buscamos a vida inteira e que, portanto, nos é precioso.
E para permitir que se dê essa passagem do amor ao desejo, o analista precisa estar regido sob seu desejo, desejo de analista, que não é o desejo do analista. Lacan 1964 pag 219 “ A transferência é um fenômeno essencial, ligado ao desejo como fenômeno nodal do ser humano, que foi descoberto antes de Freud. Ele foi perfeitamente articulado e eu – empreguei à transferência para demonstrar com o mais extremo rigor, num texto em que se debate sobre o amor, nominalmente O banquete de Platão”.
FRAGMENTOS DO CASO CLÍNICO DE UMA ADOLESCENTE OBESA
Francoise Dolto nos ensina que “a puberdade fisiológica perturba a imagem do corpo constituída na infância”.
Buscando o apoio de FREUD e LACAN, e de outros psicanalistas como DOLTO,
GUSMAN e RASSIAL o texto busca tecer articulações teóricas que permitam situar na clínica os sintomas apresentadas por Lena*, uma adolescente de 15 anos.
A jovem foi trazida pela mãe, encaminhada pela hebiatra, apresentando quadro de obesidade com alterações clínicas importantes.
No discurso de Lena sintomas depressivos, de isolamento e de dificuldades de lidar com as modificações do corpo próprias da puberdade são claramente localizados.
O que se passa com Lena nesse momento em que é trazida pela mãe seria da ordem da dificuldade de elaborar as mudanças corporais? Fazer os lutos?
Não se sentir atraente e se ”esconder” na obesidade seria a forma de evitação do encontro com o Real do sexo?
Essas e outras indagações clínicas vão nortear o texto apresentado.
Maria de Fátima Belo de Morais – Psicanalista e Psicóloga Clínica
Membro do CEF-RECIFE
O QUE É SER PSICANALISTA?
COMO SE CHEGA A SER PSICANALISTA?
Com essas indagações não me refiro, nem me interessa provocar uma reflexão pela via burocrática de índole universitária, com burocracias que atingem níveis quase delirantes. Nem busco uma resposta dessa natureza. À maneira de fazer psicanálise pela via da burocracia responde um poeta espanhol muito conhecido, com um pequeno lema:
“Caminhante não há caminho, se faz o caminho ao andar”
A proposta de Lacan é mesmo de resgatar a condição de fundação da psicanálise por Freud, sua condição subversiva. Não se pode “domesticar” a psicanálise. O que se propõe então que a psicanálise faça? Lacan diz que a psicanálise deve resgatar a condição subversiva do sujeito, ou seja, que subverte o sujeito de tal forma que o mesmo fica fora de foco e o que é restituído efetivamente é o desejo.
Desejo de analista, como ter acesso a esta condição? Aqui entramos num posicionamento central a respeito da formação do analista – o analista começa sendo analisante. O que não implica de forma alguma que para a posição do analista ele deve ser um auto-didata, nem muito menos que deve fazer sua análise com um didata. E sim, que ser analista tem início em colocar-se no lugar de analisante.
Lacan conclui: “o analista só se autoriza por si mesmo e por alguns outros”, “alguns outros” da própria Instituição da qual é membro. (In Escritos) Esse é o lugar da Instituição, lugar onde o analista tem que dar provas permanentes – sim, intermináveis – de sua formação. Existe, portanto, a necessidade de um percurso institucional, a contra-partida é de que a Instituição promova as condições de ensino e de escuta, como a participação em grupo com seus pares, um projeto de formação e estudo sempre objetivando promover a formação do analista.
Lúcia G. Buonora